quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

O celular

Ela esperava impaciente ao lado do carro, segurando o celular nas mãos, que ao primeiro sinal que ele atrasasse, ela iria por em uso. Já passava das 9 e a rua deserta de frente pro mar, estava silenciosa e profunda, ou seja, se fosse preciso chorar, ela não precisaria esconder o rosto das pessoas afinal, não haveria mais ninguém a não ser os dois e se caso fizessem amor, também teriam privacidade. “- vou esperar mais 5 minutos e então ligo”, pensou
Mas então, ela se viu em uma situação diferente, resolveu caminhar até a areia da praia, pois se ele chegasse no local combinado e não a encontrasse, certamente ele ligaria e perguntaria por onde ela estava. Então ela foi e logo estava com os pés molhados de água salgada. Percorreu boa parte da praia com a cabeça limpa e livre de pensamentos, decidiu apenas curtir o momento. Mas de repente lhe veio a cabeça que talvez simplesmente ele não viesse encontrar ela, nem ligasse. Nem procurasse por ela por um longo tempo ou nunca mais procurasse. E sumisse da cidade e esquecesse de todas promessas que fez a ela ou talvez já não quisesse cumpri-las. “- e ai?” pensou ela.
O que ela faria se tudo que ela acreditava, sonhava e vivia com ele e por ele, de repente não fizesse sentido pois ela estaria só, com seus medos e pesadelos doloridos? E se agora, de uma hora pra outra, ele desistisse de tudo e fosse morar nos EUA e tentar uma vida nova? E se ele nem se importasse em avisar? E o pedido de casamento que ela esperava a tempo, mesmo sem nem saber se aquilo podia ser chamado de ‘relacionamento’? E o futuro que tinha planejado e imaginado?
O vento soprava mais forte e ela perdida em seus pensamentos.
Foi então, que ela imaginou a situação contrária. E se quem simplesmente mudasse de rumo fosse ela? Sim, todas as lembranças tristes que ele lhe causou, podiam ter uma conseqüência desse tamanho. O futuro seria diferente sem ele, talvez ela já não quisesse um casamento e uma gritaria de crianças no jardim. Ela poderia estudar Inglês fazendo intercâmbio e sua mãe gostaria muito disso. Ou então ela faria outro curso na faculdade, porque apesar do Direito, ela sempre gostou da Biologia. Quem sabe ela pudesse viajar pra Grécia e aproveitar com alguns amigos ou ficar em casa mesmo curtindo a família. Poderia também aparecer outro cara, que lhe chamasse pra sair e ela gostasse da idéia. O futuro poderia ser promissor sem ele, talvez no fim das contas ela esquece de todos beijos, todos carinhos, do sorriso angelical que ele tinha, da maneira como fazia amor e a chamava de ‘meu bebê’. Talvez o jeito inconseqüente dele nem fizesse tanta diferença e o charme dele, de ‘homem-fatal’ nem fosse tão sensual assim.
Ou aquela voz safada no ouvido, que era muito convidativa pra uma noitada de loucuras, nem fosse tão sedutora assim como ela pensava. E esse “futuro promissor”, daqui alguns anos fizesse ela esquecer do quanto a sua TPM deixava ele irritado. E esquecesse também, de todas as vezes que ela brigava e fazia pose, só pra depois ele a encher de mimos. O tempo mudaria muita coisa. Trocaria muita coisa de lugar.
E cada lembrança do cheiro da pele dele, do suor dele, do hálito dele, da fome que ele tinha depois do sexo, do quanto ele dormia durante o filme e perguntava depois o que tinha acontecido, das conversas até de manhã, do abraço confortante que ele tinha, das sensações loucas que ela tinha com ele, dos sentimento bons que emanavam dele e do amor doentio e desvairado que tinham um pelo outro fosse apagado também. Sem dúvida ela começaria um tempo novo pra si mesma, mesmo sem saber se poderia se recuperar de cada cicatriz dessa relação boa e ruim...
O celular toca e tira ela do mundo onde se encontrava. Era ele. Sempre foi ele e sempre vai ser. Agora, pra ela, já não importava o quão promissor o futuro poderia ser sem ele, porque não seria um futuro.. não seria nem uma vida se quer.
“- Alô?” disse ela.
“- Oi, te deixei esperando tempo demais?” perguntou ele.
E então ela percebeu que a voz vinha detrás dela, então se virou e ficou imóvel admirando o real futuro que ela desejava e todo esplendor que ele trazia quando estava por perto, fazendo ela brilhar.
Em um segundo ele tomou ela nos braços e a deitou na areia.
E pronto. Bastava.
Ele, mesmo sem nem imaginar o que ela havia imaginado e pensado antes, proferiu as seguintes palavras: “- Eu nunca vou a lugar nenhum, meu lugar, meu caminho, meu futuro é você”.

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